Por que compramos um Tênis NIKE?



Para iniciarmos este estudo vamos retomar um pequeno fragmento conceitual a partir de Espinosa:

“O homem sofre a influencia de potencias exteriores e age sobre elas. Sua vida é somente uma maneira singular de afirmar sua potencia de existir no interior destas relações de forças” Espinosa, Baruch

Espinosa quebra o conceito do homem ser o império dentro do império e põe o ser humano na condição de uma finitude inserido no infinito. Um ser imanente que navega pelos campos de forças, hora conjuntamente, horas confrontantes, e que se reconhece como mortal.

Vamos partindo daqui, recortar a idéia de :   - Seres finitos inseridos no mundo infinito -  ( cujo movimento de manutenção desta existência é navegar por estas forças ) ; tentar compreender um pouco de nossa forma de viver a partir desta perspectiva.

A percepção de finitude humana nos causa um estranhamento e não aceitação perante a  infinitude do mundo; o homem morre, sabe que morre porém deseja ser eterno. Em sua luta em busca da eternidade o homem constrói primeiramente a necessidade de manter-se vivo, em um segundo momento o desejo de ser lembrado, tornar-se memorável como uma forma de alcançar a tão sonhada eternidade. O homem cria para si mitos, símbolos, esculturas, e toda a forma de marca que o torne visível e transmita ao mundo a mensagem que este sujeito está além do esquecimento no decorrer da história.

 Somado a isso, o  homem constrói as bases de sua vida , movidas por variantes de um mesmo afeto:  - A Alegria – O homem busca o prazer (existência de alegria) e a dor (ausência de alegria) .

Dentro porém de uma infinitude de coisas, objetos, subjetividades, idéias, percepções possíveis, como o homem compreende o que lhe traz alegria e o que lhe traz dor?

Nossa capacidade de selecionar, seja por nossa vontade, seja por nosso limite o que queremos ou conseguimos perceber e apreender em nossa relação com o mundo e a proporção com as quais nós elaboramos este caminho de luta contra a morte e o esquecimento e o desejo de nos tornarmos memoráveis.

Temos assim até este momento: 

- uma percepção de nossa finitude,

-  uma busca pela eternidade movida por pulsões de desejos de alcançar alegria, 

- nossa capacidade seletiva que nos guia a interpretar o que seria a alegria e a resposta a esta eternidade.

Nós como indivíduos, por muitas vezes observamos estas respostas como resultante de um desejo natural, porém não conseguimos assimilar de primeira mão que tal desejo naturalizado é apenas causa de todo um processo elaborado a partir de uma constelação de campos de forças cujo interesse humano maior é manter-se vivo. Elucidando um pouco: Tais alegrias e respostas que nos levam a alcançar a eternidade se modificam durante o decorrer da história humana na terra, hoje para a nossa geração o que nos torna seres memoráveis ou belos é muito diferente do que tornava homens de gerações passadas memoráveis ou belos, por exemplo : Não tomar banho era uma atitude da nobreza, era culto e memorável viver sujo.

Estas percepções do que seriam as respostas a eternidade são o que movimentam nossos afetos a crer que determinada coisa é uma necessidade. E sobre esta coisa jogamos com mais força nossos afetos: 

“O afeto em relação a uma coisa que imaginamos como necessária é mais intensa, em igualdade de condições do que o afeto em relação a uma coisa possível ou contingente, isto é, não necessária”

Aqui reforçamos a questão da percepção de algo necessário como diretamente proporcional ao afeto aplicado por nós a esta. Sendo assim, aplicamos nossa força e desejo a alcançar aquilo que imaginamos nos ser necessários.

Incluiremos agora mais um elemento: O VALOR

Marx cita que -  o Valor Natural de uma coisa consiste na capacidade desta de prover as necessidades ou de servir as comodidades da vida humana. -  O valor segundo Marx se relaciona com a necessidade do homem , que como visto anteriormente é compreendido pela percepção do que imaginamos necessário e pelo qual nossos afetos são impulsionados a conquistar.

E qual o resultado ou interferência?

O mercado aplica através de instrumentos próprios (como campanhas publicitárias) o valor ao imaginário, isto é, ao que percebemos como necessário para nos mantermos eternos.

 Isto é um dos fatores que por vezes nos leva a comprar um tênis da NIKE por exemplo, pois somos apreendidos pela idéia de que necessitamos de um tênis NIKE para alcançarmos a alegria e nos tornarmos memoráveis. O valor que antes era aplicado aos custos de produção mais lucro e nos era repassado é agora somado ao valor do afeto produzido pelo produto; onde o que o produto representa tem um peso muito maior do que o produto custa para ser produzido.

Calçar um tênis Nike equivale para uma pessoa ser semelhante aos seus Heróis que brilham na TV, bem sucedidos e felizes; equivale ter o que apenas alguns escolhidos pelo destino podem ter, o consumo seleto onde o que importa não é o que se compra, mas a simbologia que ela carrega. 

O mercado nos vende um desejo, relaciona este desejo a um produto, sobrevaloriza o produto e nós compramos o produto na busca do desejo.

Assim dedicamos nossos afetos a construção de um mundo onde nosso consumo por símbolos é a base formadora da subjetividade, consumo este que individualmente nos parece libertador mas por um olhar amplo vemos quão prisional é; uma prisão da qual tememos sair.

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