Índios e a cidade de São Sebastião

Texto com a prerrogativa de quem acompanhou de fora a questão indígena, portanto não se faça o texto como uma apresentação conclusiva que contemple como verdade absoluta , mas sim como um fragmento a mais do grande repertório de informações que montam este momento histórico.

Uma luta de trabalho, cultura, moradia, acima de tudo uma luta de existência, assim se apresentou o movimento da aldeia maracanã, Constituído desde o ano de 2006 a partir da ocupação do então antigo museu do Índio situado no bairro do Maracanã, o processo de posse encontrou nestas últimas semanas um desfecho impactante.   O olhar mais desavisado que pouco era capaz de enxergar a presença por 6 anos de um movimento indigena ganhando forma e vida no olho central do principal símbolo dos mega-eventos, ficou por muito consternado e incrédulo diante questões simples como: –Por que índios lutam por uma edificação contra a especulação imobiliária? Por que indios estão habitando em um centro urbano altamente densificado?  Que proposta de ruptura cultural é esta diante de nossos olhos?  ou perguntas aparentemente mais óbvias como: o que é a reinvidicação? moradia? patrimônio cultural? trabalho?

Nossas relações habituais com a cidade pôs nestas últimas semanas diante de um grande impasse, enxergamos a nossa frente, estes que um dia foram donos e hoje se tornaram hóspedes da terra, saindo de seus padrões estereotipados em nossas mentes, (sair não deveria ser o termo correto, pois os mesmos nunca estiveram embebidos no estereótipo)  e se representando em nova forma, homens em uma luta para existir.  Existir não apenas como mitos ou quimeras nas mentes de nossos netos, mas sim como cidadãos  políticos capazes de construir juntos. 

A aldeia Maracanã levanta um conflito muito maior que o embate  inerente ao conceito de Cidade-Mercado instalado no Rio de Janeiro, pois carrega em si a peculiaridade indígena que a difere da Vila Autódromo, dos que estão nos caminhos dos BRT, dos “Pacificados” ou das vítimas das grandes chuvas.

Somos obrigados a romper a ilusão dos bons-selvagens, dos índios puros que querem só plantar, pescar e construir ocas, e que sempre nos fez duvidar da ausencia da “alma indigena” naqueles que decidiam por se inserir na cidade, e enquadrar-se em uma nova estética.  A luta indígena da Aldeia Maracanã, choca-se diretamente contra isto, e escreve uma estética pouco vista no Rio de Janeiro: o Índigena que pode ser urbano e ainda assim ser índio, que luta para que seu patrimônio, sua história não seja apenas preservado, mas seja potente para se sustentar e fazer política, Índios que não se propõem a ser meros coadjuvantes de sua extinção, nem ver parte de sua história virar estacionamento.

A partir daqui podemos novamente unificar Bumba, Vila Autódromo, Aldeia Maracanã, Moradores nos caminhos do BRT, Moradores “Pacificados”, entre outros que estão vendo a cidade mudar sem que sejam sequer consultados, cujas lutas antes de ser frutos de ideologias, desejos, reflexões ou filosofias, é fruto da necessidade de ser manterem vivos.

Assim vai se construindo o Rio de Janeiro, uma metrópole que é pensada pelas instancias de governo apenas como um jogo de tabuleiro, onde o que vale são os negócios e leilões,  girando em uma espiral viciosa insustentável, que conforme dá alguns sinais de fadiga ( bolhas universitárias e bolhas imobiliárias dando seus primeiros sinais de vida)  busca no grito aparentar-se forte e viril. 

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3 Comentários

  1. cara, muito bom o texto. é interessante quebrar com esta coisa de "ofereçam o mato aos indios". o pouco tempo que passei por lá ví indigena universitário, indigena advogado... o indio que na cidade preserva sua cultura e não abre mão do protagonismo citadino.

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  2. Excelente texto.
    Elucida muito bem a nulidade da qual submete os indígenas, política e culturalmente, da atual fase neoliberal do estado.

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